Delação aponta para elo entre PCC e máfia no envio de
cocaína do Porto de Paranaguá para a Europa
Investigações da
Polícia Federal (PF) apontam que o Porto de Paranaguá, no litoral do Paraná, se
tornou uma rota consolidada para o tráfico de drogas da América do Sul com
destino ao continente europeu em uma operação envolvendo a facção criminosa
Primeiro Comando da Capital (PCC) e a máfia italiana 'Ndrangheta. A operação do
crime a partir do porto paranaense - maior responsável pelas exportações do
agronegócio brasileiro - é alvo de operações desde 2020.
São ações que
resultaram em condenações na Justiça e delações premiadas. Os acordos de
colaboração firmados auxiliaram as autoridades do Brasil e da Itália a
desvendar a rede internacional de tráfico de drogas.
Em dezembro, a "Operação Mafiusi" identificou que, além do tráfico de drogas, o grupo
movimentava empresas e contas bancárias de fachada para lavagem de dinheiro com
aquisição de bens e transações fraudulentas. Segundo apuração da Gazeta do
Povo, a PF identificou que o empresário paulista Willian Barile Agati atuava
como um facilitador do crime organizado, responsável por fornecer
infraestrutura para o tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro,
incluindo aeronaves, veículos e imóveis de luxo.
SAIBA MAIS: QUEM É O LÍDER DO TRÁFICO CHAMADO PELA POLÍCIA DE 'FAZ-TUDO' DO PCC
Investigação
As investigações
avançaram após o acordo de delação premiada firmado na 23ª Vara Federal de
Curitiba com um empresário paranaense, considerado peça-chave no esquema de
lavagem de capitais, que teria confirmado fatos e dados levantados pela Polícia
Federal em outras operações. Durante o período de investigação, entre 2018 e
2022, a movimentação financeira alcançou aproximadamente R$ 2 bilhões.
O delegado da PF em
Curitiba Eduardo Verza informou que a operação Mafiusi revela que o Porto de
Paranaguá era uma rota consolidada da organização criminosa (ORCRIM), que
também utilizava aeronaves privadas para o tráfico intercontinental. “O
modal marítimo era o principal utilizado pela organização criminosa, em
especial o porto de Paranaguá, onde foi consolidada uma rota fixa para o envio
de diversos carregamentos para o exterior”, declarou o delegado durante a
operação em dezembro.
Segundo Verza, a
ação no final do ano passado foi um desdobramento da "Operação Retis", deflagrada
em março de 2022, quando a PF identificou grupos especializados em logística
para remessa de carregamentos de cocaína para Europa, por meio do Porto de
Paranaguá. “Vimos que aquele núcleo era apenas uma parte de algo muito maior
com ramificações em diversos países, que promovia o tráfico internacional de
cocaína em larga escala, inclusive com uma rota consolidada no Porto de
Paranaguá com destino previamente definido para Valência, na Espanha”, informou
ele.
De acordo com a
investigação, a droga era ocultada em contêineres com cargas como cerâmica,
louça sanitária e madeira. Nove mandados de prisão preventiva foram cumpridos
no Brasil e um na Espanha.
O trabalho conjunto entre autoridades brasileiras e italianas teve início em 2019, quando dois mafiosos foram presos em Praia Grande (SP), na Baixada Santista, caso que levantou as primeiras suspeitas sobre a conexão entre os grupos criminosos. “Membros da máfia italiana estavam no Brasil para intermediar as relações com os traficantes na remessa da droga para a Europa, onde ela era recebida e distribuída por membros dos clãs, sediados principalmente na região de Piemonte [na Itália], para o tráfico em larga escala no país”, completou o delegado.
Segundo apuração da
Gazeta do Povo, o principal delator do caso forneceu evidências, por meio da
apresentação de mensagens criptografadas do aplicativo Sky ECC, sobre as
ligações de Agati com Nicola e Patrick Assisi, membros da máfia calabresa
'Ndrangheta. Agati também teria oferecido uma “carteira de cônsul” de
Moçambique a um dos criminosos, sugerindo a montagem de operações no país
africano a pedido de líderes do PCC, entre eles o traficante internacional Gilberto
Aparecido Santos, conhecido como “Fuminho”.
De acordo com um
relatório da PF publicado pelo jornal Estadão, as mensagens criptografadas
ainda apontam que um guarda civil foi assassinado por vingança por um suposto
desvio do carregamento de cocaína do porto no litoral paranaense. Ele foi
executado dentro do carro em Paranaguá por dois homens fortemente armados.
Nas mensagens
entregues pelo delator, conforme o jornal, um usuário com apelido Tony Stark
relata a Agati como foi a decolagem de um avião que partiu do Brasil com um
carregamento de cocaína para Europa. “A cena foi linda. Merece um seriado
mexicano.” Na sequência, o empresário brinca: “Narcos 5. Vamos lançar.” A série
da Netflix “Narcos” conta a história do tráfico de drogas na Colômbia e no
México desde a ascensão de Pablo Escobar no cartel de Medelín até o domínio dos
clãs mexicanos por Joaquín “El Chapo” Guzmán.
O principal delator
do caso foi alvo da "Operação Narcobroker", deflagrada em novembro de 2020 pela
Polícia Federal de Curitiba. À época, a Justiça Federal determinou o bloqueio
de contas de 68 pessoas físicas e jurídicas que, segundo as investigações,
tiveram movimentação suspeita de aproximadamente R$ 1 bilhão entre 2018 a
2020.
SAIBA MAIS: OPERAÇÃO NARCOBROKER: 13 PESSOAS SÃO CONDENADAS PORNARCOTRÁFICO
Mais de R$ 40
milhões em bens do narcotráfico foram sequestrados pela operação, entre eles
uma residência avaliada em aproximadamente R$ 6 milhões na capital paranaense.
Dois anos depois, a Justiça Federal condenou 13 pessoas por tráfico
internacional de drogas e lavagem de dinheiro com penas de quatro a 31 anos de
prisão, em regime fechado.
Durante as
investigações da operação Narcobroker, 240 quilos de cocaína em uma carga de
papel e 325 quilos da droga em um carregamento de madeira, ambos com destino à
Europa, foram apreendidos no porto de Paranaguá.
O empresário Willian
Barile Agati está preso desde o final de janeiro, quando se apresentou na
Delegacia de Capturas de São Paulo em decorrência da operação Mafiusi. Em nota
enviada à Gazeta do Povo pelo advogado criminalista Eduardo Maurício, o empresário
alega que é inocente.
Pedido de Habeas Corpus
O representante de
Agati também informou que deve impetrar um pedido de habeas corpus no Superior
Tribunal de Justiça (STJ) para revogação da prisão preventiva. “Willian
Agati é um empresário idôneo e legítimo, primário e de bons antecedentes, pai de
família, que atua em diversos ramos de negócios lícitos, nacionais e
internacionais, sempre com ética e seguindo as leis vigentes e os bons
costumes”, afirma a nota.
Na avaliação do
advogado, a prisão é abusiva e causa “constrangimento ilegal”, pois Agati se
colocou à disposição da Polícia Federal para “colaborar com a Justiça na busca
da verdade real dos fatos”. Ele ainda classifica as informações fornecidas nos
depoimentos da delação premiada como “ilações”.
“A investigação
afirma ser ele autor de delitos com base em ilações sem qualquer fundamento,
baseadas em conversas telefônicas no telefone criptografado SKY ECC, prova
manipulada e nula de pleno direito, que fere a cadeia de custódia da prova, lei
de interceptação telefônica e normas e princípios constitucionais, sendo certo
que Willian nunca utilizou esse tipo de telefone”, defende.
O advogado também
afirma que o empresário não comentou nenhum crime de tráfico internacional de
drogas, lavagem de dinheiro, organização criminosa, associação criminosa ou
corrupção. “Isso ficará provado ao final do processo, bem como jamais teve
qualquer relação ilícita ou ilegal com funcionários do Consulado de Moçambique
no Brasil e nunca teve qualquer conexão com o PCC e nem com a máfia Italiana.”
Nota da Autoridade Portuária
Em nota à Gazeta do
Povo, a Portos do Paraná - empresa responsável pela administração de Paranaguá
e Antonina (Autoridade Portuária) - afirmou que a atual gestão trabalha no
combate ao tráfico internacional de drogas por meio de ações desenvolvidas pela
Guarda Portuária (GPort). Conforme dados comparativos apresentados pela
empresa, 15 toneladas de cocaína foram apreendidas em 2019, ano em que a atual
gestão assumiu o comando da estatal.
Em 2024, foram duas
toneladas, o que na avaliação da Portos do Paraná aponta para efetividade das
ações contra o tráfico de drogas em Paranaguá e Antonina. “As ações da
Autoridade Portuária de Paranaguá têm afastado criminosos, que passaram a
buscar outras formas de tráfico, inclusive utilizando outros portos ou atuando
fora das áreas de operações portuárias”, afirma a nota.
Guarda Portuária - GPort
De acordo com a
Guarda Portuária, as tentativas de envio de drogas para fora do país ocorrem
por meio dos contêineres, na maioria dos casos flagrados. Para fiscalização e
controle das áreas portuárias, a Portos do Paraná informa que conta com um
parque de monitoramento com mais de 400 câmeras e faz vistorias com cães
farejadores.
“Há diversas formas de detectar esse tipo de crime. Uma delas é o sistema de rastreabilidade, que identifica, por exemplo, a entrada de pessoas e veículos não autorizados na faixa portuária”, acrescenta.
Fonte: Gazeta do Povo
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