Guardas
portuários foram obrigados a realizar horas extras acima dos limites legais
Dentre as grandes
mudanças ocorridas recentemente no país, fruto da indignação política contra a
corrupção, um novo discurso (quase um mantra) surgiu na sociedade brasileira,
principalmente na administração de algumas estatais, entre elas a SPA - antiga Codesp
- que em um processo de “modernização” trocou até de nome. Nesse “novo”
discurso, palavras como profissionalização, eficiência, competência,
integridade etc., eram entoadas por todos os lados. Parecia que sairíamos de um
modelo ultrapassado, pré-histórico de gestão, para o que há de mais atual e bem
informado sobre as novas tendências do mercado. Nada de apadrinhados políticos
ou de qualquer outra espécie, mas somente profissionais altamente qualificados
haveriam de colocar a empresa em níveis mais elevados.
De fato, muito do
que foi anunciado se concretizou, algumas práticas inadequadas e antiquadas
foram dando lugar a outras novas e, podemos dizer, boas práticas de gestão. No
âmbito das finanças, o que dizer então? A SPA passou a ser uma empresa lucrativa
e, há, para o ano que vêm, até uma promessa de PLR. Contudo, nem tudo é digno
de louvor. Se olharmos a situação financeira dos “colaboradores” (gostam de
chamar assim) a situação somente piorou. Cortaram horas extras, não tiveram
sequer a reposição da inflação e outras sequencias quase infinitas de maldades
vêm acontecendo. Até para uns poucos privilegiados que nesse período
tornaram-se “chefes” a coisa não anda muito boa.
LEIA TAMBÉM: TERRORISMO PSICOLÓGICO NO PORTO DE SANTOS
Mas, vamos ao que
interessa: o que temos entre nós afinal? Uma gestão de lobos ou de cordeiros?
Bem, se formos julgar pelo que há de mais atual em termos de gestão
precisaríamos falar no tal de ESG. Não o faremos neste momento, mas
apresentaremos aqui alguns conceitos básicos para que possamos chegar a uma
análise e julgamento adequado da pergunta formulada acima.
A sigla ESG, em
inglês, significa Environmental, Social and Governance, ou traduzindo:
Ambiental, Social e Governança. Estas três características juntas criam as
melhores práticas que devem ser implementadas para demonstrar não só a solidez
de uma empresa, mas também a sua preocupação e, principalmente, atuação, contra
riscos à sustentabilidade. A nomenclatura segue os 10 princípios do pacto
global, que são: 1. Respeito e proteção aos direitos humanos reconhecidos
internacionalmente; 2. Garantia de que a empresa não participa da violação dos
direitos humanos; 3. Apoio à liberdade de associação e o reconhecimento à
negociação coletiva; 4. Eliminação completa e absoluta do trabalho forçado ou
compulsório; 5. Abolição do trabalho infantil; 6. Eliminação de discriminações
no trabalho; 7. Apoio preventivo aos desafios ambientais; 8. Criação de
iniciativas para promover maior responsabilidade social; 9. Incentivo às
tecnologias ambientalmente amigáveis; 10. Combate à corrupção em todas as suas
formas.
Vamos nos atentar
aqui, hoje, somente nos itens 4 e 6 do Pacto Global e analisar as recentes
ações da SPA. No item 4 vemos o título: eliminação completa e absoluta do
trabalho forçado ou compulsório. Recentemente, devido à elevação de nível de
segurança, diversos colegas foram chamados a trabalhar compulsoriamente em
regime extraordinário, ou seja, foram obrigados a trabalhar independentemente
de sua vontade, acima dos limites legais, inclusive colegas em cargos
comissionados. Vejamos como é a definição de trabalho forçado no Manual
elaborado pela OIT1: “Todo trabalho ou serviço que for extraído de qualquer
pessoa sob ameaça de qualquer penalidade para o qual a referida pessoa não
tiver se oferecido voluntariamente”. Bom, acontece que alguns guardas
portuários foram obrigados a realizar horas extras acima dos limites legais e
contra sua vontade. Foi-lhes dito que se recusassem a dobra teriam que
apresentar os motivos na corregedoria (o que, como veremos, configura o
trabalho forçado). Contudo, se ainda restam dúvidas, se alguém alegar que este
manual não se aplica ao caso em questão, vejamos o que está escrito no mesmo
manual na pág. 13 para facilitar a identificação de trabalho forçado na
prática: “Compulsão psicológica, ou seja, uma ordem de trabalhar reforçada por
ameaça plausível e penalidade por descumprimento”, e, ainda, na segunda parte
do manual no item 3 – “práticas exploradoras” tais como horas extras forçadas.
Mais à frente, na pág. 23, no item 3 – de perguntas e respostas - vemos o
seguinte: “exigência de trabalhar horas extras para cumprir prazos de produção
pode ser considerada trabalho forçado? A obrigação de trabalhar horas extras
não é considerada trabalho forçado se mantida dentro dos limites permitidos
pela legislação nacional ou acordada em acordos coletivos. Isto significa que,
de acordo com padrões internacionais, o trabalho forçado somente ocorre se for
obrigatório trabalhar horas extras para além dos limites semanais ou mensais
permitidos pela lei, independentemente dos motivos para tais horas extras. Se o
empregador exigir que os trabalhadores trabalhem sob tais condições, em clara
violação à lei e sob a ameaça de penalidade, pode ocorrer trabalho forçado”.
Cremos que tal
situação está clara o suficiente. A SPA está infringindo itens da convenção 29
da OIT, o que não é nada bom, pois as empresas que forem identificadas como
estando envolvidas em tais atividades podem ser processadas e seus gestores
punidos na forma da lei. Além disso, as alegações de trabalhos forçados
representam riscos legais, bem como sérias ameaças à reputação da marca e da
empresa. A eliminação do trabalho forçado é um elemento chave dos códigos de
conduta e outras iniciativas RSC (Responsabilidade Social Corporativa). As
empresas – em especial aquelas que abastecem mercados consumidores e têm uma
marca de grande valor – enfrentam expectativas novas e crescentes de que a
produção irá cumprir certos critérios sociais e de direitos humanos. Por fim, o
trabalho forçado é moralmente inaceitável. Esperamos, sinceramente, que a SPA
reveja seus valores, para que tais atos não venham a manchar a reputação e
marca que com tanto empenho seus gestores têm procurado consolidar.
Passemos agora ao
item 6 do Pacto Global: Eliminar a discriminação no emprego. Ora, sequer é
preciso uma longa explicação sobre isso quando até fizeram uma lista (oculta)
baseada em ganhos e idade (?) para “escolher” quem pode ou não realizar horas
extras. Melhor deixar os próprios gestores se explicarem, ou melhor, se
desculparem e corrigirem o erro, pois de acordo com o Manual para a realização
de horas extras, o que parece evidente é que usaram de um chamado princípio de
economicidade para efetuar descaradamente a discriminação no trabalho. A
pergunta que fica é: É sério que os atuais gestores da SPA pretendem enfrentar
essas questões no ministério do trabalho ou prevalecerá o bom senso desta vez?
Fonte: Sindaport/ A Diretoria
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