Em
entrevista exclusiva ao G1, delegado Ciro Tadeu Moraes, que já combateu o
tráfico na fronteira com a Bolívia, fala em tornar a polícia marítima mais operacional
no Porto de Santos
O
delegado Ciro Tadeu Moraes, de 51 anos, é o novo chefe da Polícia Federal em
Santos, no litoral de São Paulo. Este mês, ele assume o cargo então ocupado
pelo delegado Gilberto Antônio de Castro Júnior, que, após um ano, decidiu
retornar ao comando da unidade de São Sebastião (SP).
Moraes
está há uma década em Santos, mas há 16 anos na PF - a maior parte deles
dedicada ao combate ao narcotráfico. O convite à função partiu do novo
superintendente paulista, o delegado Lindinalvo Alexandrino de Almeida Filho,
empossado após as mudanças de gestão em Brasília (DF).
A
unidade é considerada uma das mais relevantes e estratégicas do órgão. Além de
abranger 24 cidades entre as regiões da Baixada Santista e do Vale do Ribeira,
onde vivem aproximadamente 2,5 milhões de pessoas, é também responsável pelo
Porto de Santos, o principal do país.
Gilberto
retornou à delegacia da qual é procedente, pois entendeu que a missão dele foi
cumprida. O pedido foi acatado pelo superintendente. No início de 2018, o agora
ex-chefe de Santos recebeu ordens para garantir apoio às investigações que
ocorriam no porto.
"Santos
é uma delegacia que tem um viés operacional muito grande, com várias
investigações importantes. A minha missão está muito clara: continuar o
trabalho que já era realizado, além, é claro, de viabilizar toda e qualquer
necessidade dos colegas", afirma o novo delegado-chefe.
Ciro
quebrou uma tradição e decidiu não presidir a Comissão Estadual de Segurança
Pública nos Portos (Cesportos), cuja coordenação cabe à PF, antes representada
pelo chefe da delegacia santista. O dever foi entregue à delegada Luciana
Fuschini, interina desde a transição.
"A
delegada está fazendo um excelente trabalho. Eu entendo que meu papel é
auxiliá-la e, também, ajudar a comissão como um todo, mas não na
coordenação", afirma o delegado. A Cesportos reúne órgãos diversos e é
responsável pelo planejamento de ações de segurança no cais.
Formado
em Direito, Moraes também é administrador. Começou a carreira como agente na
capital paulista, depois passou em concurso para delegado e trabalhou em
unidades da PF no Mato Grosso por três anos e meio, antes de ser transferido
para o litoral paulista.
"Muito
difícil comparar. Em Mato Grosso, eu trabalhei na repressão de entorpecente e,
lá, a gente cuidava da droga entrando no país. Aqui, temos no maior porto do
Brasil, o maior da América Latina, um grande porto de trânsito de droga, de cocaína,
para a Europa", comenta.
Entre
as operações das quais fez parte, ele destaca Sapicuá (2007) e Fronteira Branca
(2009), no combate ao tráfico na fronteira com a Bolívia. O delegado lembra,
ainda, da Navio Fantasma (2012), contra o contrabando, e Opus Magna (2013), de
desvio de químicos no porto.
Em
Santos, o delegado já chefiou os núcleos de Operações, de Polícia Marítima e de
Inteligência. Também atuou na substituição do comando da delegacia na ausência
do delegado-chefe, assim como na função de delegado-executivo (o número dois na
escala de hierarquia do órgão).
"É
evidente que [o combate ao narcotráfico] é importante. É um lado que eu sempre
estive envolvido. Vamos continuar combatendo, mas, não é nosso único foco de
trabalho. Toda investigação que se inicia é muito importante, independentemente
da área", afirma.
A
primeira entrevista de Ciro Tadeu Moraes como delegado-chefe da Polícia Federal
em Santos foi concedida ao G1.
Como foi o convite para
comandar a Delegacia da Polícia Federal em Santos?
Fui
chamado pelo superintendente para uma reunião há cerca de um mês, e ele
explicou qual era a situação em relação à chefia de Santos. O doutor Gilberto
tinha a pretensão de sair da delegacia, pois tinha a ideia de voltar a São
Sebastião. Por isso, ele me convidou para a chefia. Ele considerou o trabalho
anterior aqui mesmo na delegacia em Santos. Pedi um dia para pensar, e eu
aceitei. Aqui em Santos, já fui chefe de alguns núcleos: Operações, Especial de
Polícia Marítima e Inteligência Policial. Eu também já atuei em substituição ao
próprio chefe da delegacia e ao delegado-executivo.
Qual a diferença de gestão
entre a função de chefe de núcleo para a de delegado-chefe? Para o senhor, é um
novo desafio?
É
lógico que é um desafio, embora eu já tenha exercido funções não tão
abrangentes como a de chefe da delegacia. Eu encaro como um desafio. Foi um
pouco de surpresa, claro, mas, depois, refletindo, é natural que o convite
poderia ocorrer, assim como eu imagino que para o todos os delegados aqui de
Santos, pois todos têm condições de chefiar. Agora, como chefe da delegacia,
tudo está incluso. Tenho sob responsabilidade a gestão, gestão de pessoas e de
material, por exemplo. Santos é uma delegacia grande e importante, com tantos
municípios sob responsabilidade. Como chefe de núcleo, você tem questões específicas,
enquanto que, agora, tudo se torna mais amplo.
A sua carreira é fincada
na presidência de inquéritos, na investigação, no trabalho de rua. O que o
senhor pretende ao assumir a função de chefe?
Embora
eu tenha dito que é um novo desafio, mas, sinceramente, eu não encaro como algo
difícil, impossível ou desagradável. É adaptação. Eu gosto muito do inquérito
policial, eu gosto da investigação. É difícil, pela carga de trabalho da chefia
da delegacia, eu conseguir manter isso. Com relação a estar na chefia na
delegacia, eu sei o que eu quero fazer e sei qual é meu papel, que é o de
permitir que os colegas trabalhem e dar condições para que os policiais
trabalhem e façam o melhor trabalho possível, sem prejuízo pessoal de cada um.
Meu maior papel de chefe é ajudar as pessoas que estão com você a conseguirem
fazer os respectivos trabalhos. Não é somente você cobrar ou direcionar,
afinal, todo mundo sabe o que tem que fazer e todos têm a intenção de fazer bem
feito. Você tem é que prover esses meios. Eu quero viabilizar o trabalho deles.
O delegado Gilberto
Antônio de Castro Júnior, seu antecessor, chegou a Santos com a clara missão de
dar continuidade ao trabalho do então delegado-chefe Julio Cesar Baida Filho,
que foi retirado do cargo repentinamente pelo antigo diretor-geral da Polícia
Federal. Entre os objetivos estavam a de dar andamento às investigações que
ocorriam, sem qualquer tipo de possível interferência externa. Qual é a sua
missão?
A
missão, para mim, está muito clara. Santos é uma delegacia que tem um viés
operacional muito grande, com várias investigações importantes. A minha missão
está muito clara: continuar o trabalho que já era realizado [e que foi iniciado
pelos antecessores], além, é claro, de viabilizar toda e qualquer necessidade dos
colegas.
O senhor é bastante
conhecido pelo combate ao tráfico internacional de drogas, inclusive quando
esteve trabalhando no Mato Grosso. Esse será o foco da sua gestão?
Minha
formação, por assim dizer, foi no combate ao tráfico de drogas. O primeiro
flagrante que eu dei foi no Aeroporto [Internacional de São Paulo] no crime de
tráfico. Era um africano que estava embarcando em um avião. No raio-X, se
percebeu que tinha alguma coisa. Mas é difícil falar em principal foco. A gente
não pode estipular que é um foco e direcionar todas as ações para um só lado. É
evidente que [o combate ao narcotráfico] é um lado importante e que eu estou
diretamente envolvido, o que me faz evitar a tendência de direcionar as forças
para esse lado. Vamos continuar, claro, combatendo, mas não é nosso único foco
de trabalho. Toda investigação que se inicia é muito importante,
independentemente da área. Não temos como estipular o combate a um crime
específico. A delegacia em Santos tem uma característica que não é só Polícia Federal
em Santos que investiga os crimes ocorridos aqui. Você sabe que tem várias
operações policiais que ocorrem no Brasil inteiro, que têm investigado ou têm
situações investigadas em Santos e em toda a região. Isso é extremamente comum,
e a gente dá apoio nessas situações.
Qual a diferença entre o
trabalho realizado nas unidades da Polícia Federal no Mato Grosso e em Santos?
Muito
difícil fazer essa comparação. Em Mato Grosso, eu trabalhei na delegacia de
repressão de entorpecentes, e lá a gente cuidava da droga entrando no país.
Aqui [Santos], a gente tem no maior porto do país, no maior porto da América
Latina, um grande local de trânsito de droga, principalmente de cocaína para a
Europa. A gente cuida e tenta evitar a droga saindo do país, depois dela ter
feito todo o esse trânsito entre a fronteira terrestre [do Brasil] com os
países andinos [Bolívia, Peru e Colômbia] e a saída [da droga] pelo porto [para
o continente europeu], por exemplo.
Ainda sobre o tráfico
internacional de drogas, o Porto de Santos registrou recordes de apreensões nos
últimos anos. Os números são resultados do trabalho da Polícia Federal e de
ações de outros órgãos. O senhor, inclusive, defende a formação de grupos de
trabalho entre órgãos para não somente troca de informações, mas para
fortalecer o combate ao crime em uma união de esforços, certo?
Não
existe, hoje, formalização de grupos de trabalho para, por exemplo, o combate
ao crime organizado. O que existe, e talvez seja o mais importante, é que, de
fato, se atua nesse sentido. O combate ao tráfico é um dos exemplos, e é de
percepção mais fácil. A Receita Federal, por exemplo, a partir de informações
que ela mesmo obteve, ou a partir de informações da polícia, ou mesmo por meio
da própria sistemática de impedimento de situações ilícitas nos terminais,
detecta uma carga de droga em contêiner e, a partir daí, pela investigação da
Polícia Federal, você consegue chegar à autoria. Assim, você percebe uma
sinergia clara entre os órgãos. Eu acho que é um exemplo bem palpável. A gente
consegue ver que na prática funciona, embora não tenha essa formalização de um
acordo de cooperação, por enquanto.
A formalização é
necessária?
Eu
acho que não. Talvez, se não estivesse funcionando, seria necessária para
começar a funcionar.
O senhor falou sobre
autoria do crime. Por qual motivo se apreende tanta droga no porto, mas
aparentemente não se chega ao dono dessa carga ilícita?
No
momento da deflagração de uma operação, é quando a gente vai indicar quem era o
dono da droga e quem mais estava envolvido. Quando há o flagrante, as pessoas
notam mais rapidamente os envolvidos, mas há situações em que a droga é localizada
e, a partir disso, a gente chega em outras pessoas. Em muitos casos, a gente
não consegue ir além dessas pessoas, pois as quadrilhas que atuam no tráfico de
drogas são em formato celular. Então, a pessoa que foi presa em flagrante, às
vezes, nem sabe quem são os donos da droga e nunca tiveram contato com eles,
mas, sim, outra pessoa que também não identificou de forma completa ou
verdadeira. Muitas vezes, a investigação se exaure lá, naquela pessoa. A
situação muda quando a apreensão de droga faz parte de um conjunto de uma
investigação maior. A gente, também, às vezes, pode chegar no comprador da
droga em outro país e fazer o caminho inverso.
Sobre questões
administrativas, há o projeto da sede própria da Polícia Federal em Santos que
ainda não saiu do papel. Há previsão disso acontecer e houve alteração do
projeto pelas obras que a prefeitura anunciou para essa região da cidade?
Não
temos nada objetivo, por enquanto. Temos muita vontade e estamos buscando para
que a gente consiga executar, em contato com os colegas em Brasília [DF]. Temos
essa área cedida [pela União] na Ponta da Praia, mas ainda sem prazo para
executar o prédio. Permanece no mesmo local, mas essa área sofreu adaptação. A
nova área que está delimitada é perfeita e atende às necessidades.
O Núcleo Especial de
Polícia Marítima (Nepom), que hoje ocupa uma área entre um terminal de
contêineres, seria transferido para esse terreno cedido para a União, mesmo
ainda sem a construção do prédio. Isso ainda vai acontecer?
A
transferência demandaria um dispêndio de dinheiro não disponível atualmente,
embora fosse uma possibilidade aventada na época.
Ainda sobre o Nepom, há
algum investimento previsto ou mudança prevista?
Ainda
é cedo, mas, a gente vai tentar dar um caráter mais operacional possível ao
Núcleo de Polícia Marítima. Hoje, grande parte do efetivo está envolvido no
atendimento ao público, já que a gente faz o controle de entrada e saída dos
navios e dos tripulantes. É um trabalho burocrático bastante grande. A gente
vai tentar que até as pessoas envolvidas nesse trabalho tenham condições, de
alguma forma, de participar mais na operação de polícia marítima. Recentemente,
foram investidos aproximadamente R$ 200 mil com nova antena de comunicação e
salas de trabalho.
O senhor quebra uma tradição
de que os chefes da Polícia Federal em Santos, até então, acumulavam a função
de presidência da Comissão Estadual de Segurança Pública nos Portos, Terminais
e Vias Navegáveis (Cesportos) de São Paulo, que reúne diversos órgãos, como
Polícia Militar, Polícia Civil, Agência Nacional de Transportes Aquaviários
(Antaq), Receita Federal, autoridade portuária e outros. Por qual motivo?
A
coordenação da Cesportos está sendo executada pela delegada Luciana Fuschini
[que era suplemente do ex delegado-chefe e que assumiu a presidência interina
durante a transição de chefes], que está fazendo um excelente trabalho. Não tem
nenhum sentido, por eu estar como chefe da delegacia, dizer que eu vou fazer um
trabalho melhor que o dela e, então, fazer a coordenação da Cesportos. Eu acho
que meu papel é ajudar a Luciana e ajudar a Cesportos como um todo, mas não na
coordenação. Eu entendo que eu, enquanto chefe da delegacia, não tenho que
estar coordenação.
Se o senhor tivesse que
fazer um retrospecto, qual a avaliação da sua carreira. Esperava estar onde
está hoje?
Eu
trabalhei pouco mais de 10 anos como administrador nos Correios. Gostava do que
fazia, e sempre gostei, mas sempre quis ser policial. Até na época que eu
estava nos Correios, e tinha essa admiração pela Polícia Federal. Eu passei no
concurso para agente de Polícia Federal em São Paulo, depois, fiz outro
concurso para delegado, e passei. Eu sempre quis ser policial federal, não
necessariamente estar nessa cadeira [de chefe]. Quando entrei pela primeira vez
na polícia, no cargo de agente, já me senti muito realizado. Profissionalmente,
realizado já sou.
Fonte:
G1 Santos
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