Maior
parte dos servidores continua recebendo salários do governo e defesas obstruem
sindicâncias da CGU; na esfera criminal, processo será longo.
Enquanto
o país assiste, estarrecido, ao desenrolar da Operação Lava Jato, que apura o
desvio de bilhões de reais da Petrobras para os cofres de partidos políticos,
outra investigação que começou com o mesmo estardalhaço caminha a passos
lentos, sem que punições tenham sido aplicadas aos principais envolvidos.
Trata-se da Operação Porto Seguro, que completou dois anos no último domingo.
Segundo a Polícia Federal, o esquema viabilizava a negociação de pareceres
técnicos com a ajuda de servidores de diferentes esferas da República: desde o número
dois da Advocacia-Geral da União (AGU) até a chefe do gabinete da Presidência
da República em São Paulo, Rosemary Noronha.
Nesse
período, 23 pessoas foram indiciadas pela PF e 24 foram denunciadas pelo
Ministério Público. Contudo, entre os 15 funcionários públicos envolvidos, nove
continuam recebendo salários do governo. Os que foram exonerados são Rosemary,
o nome mais proeminente da turma, o diretor da Antaq, Tiago Lima, o agente da
Secretaria de Patrimônio da União (SPU), Mauro Henrique Costa Souza, e o
ouvidor afastado da Antaq, Jailson Santos Soares. O delator do esquema, Cyonil
da Cunha Borges, técnico do Tribunal de Contas da União (TCU), pediu a própria
exoneração e, hoje, trabalha como servidor do governo do Rio de Janeiro, após
ter sido aprovado no concurso de auditor fiscal da Secretaria da Fazenda.
Os
demais dez servidores envolvidos continuam recebendo religiosamente seus
rendimentos provenientes da União - um custo mais de 2 milhões de reais para os
cofres públicos, segundo dados do Portal da Transparência.
A
situação dos envolvidos na Operação Porto Seguro é mais um dos casos de
imoralidade dentro da legalidade. Segundo a lei nº 8.112/90, que trata do
funcionalismo público, os servidores concursados só podem ser demitidos em duas
hipóteses: se forem julgados e condenados na esfera criminal por algum crime
contra a administração pública, ou se forem alvo de condenação na esfera
administrativa, por meio de processos administrativos disciplinares (Pad).
Sempre que um servidor é indiciado pela Polícia Federal ou denunciado pelo MPF,
o Pad se faz necessário. É o caso dos participantes da trupe de Rosemary.
Segundo
a Controladoria Geral da União (CGU), apenas o Pad de Rose, como é conhecida,
foi concluído. Os demais ainda estão em aberto — alguns obstruídos pelas
defesas dos indiciados. No caso de Rubens Carlos Vieira, ex-diretor da Agência
Nacional de Aviação Civil, a conclusão do processo está prejudicada por uma
ordem judicial conseguida pela defesa, que exclui Vieira da obrigação de ser interrogado.
No caso dos funcionários do Ministério da Educação, Márcio Alexandre Lima e
Esmeraldo Malheiros Santos, acusados de fornecer certificados e diplomas a
troco de favores, os processos só não foram concluídos porque foram expedidos
três mandados de segurança e duas ações cíveis para impedir a exoneração dos
servidores. O mesmo ocorreu com a funcionária da SPU, Evangelina Pinho. No caso
de José Weber Holanda, que era o então número dois da Advocacia Geral da União
(AGU), houve afastamento do cargo, porém, ele continua atuando no órgão para o
qual foi concursado, que é o Ministério do Planejamento. Já Ênio Soares Dias,
ex-chefe de gabinete da Antaq, continua sua função, porém, loteado em outro
órgão: o Ministério dos Transportes.
No
âmbito criminal, o processo caminha a passos de tartaruga. Apenas em fevereiro
deste ano a Justiça Federal decidiu abrir ação para apurar crime por parte de
Rosemary e outros dezessete envolvidos no esquema. A denúncia do Ministério
Público havia sido feita em dezembro de 2012, menos de um mês após a
deflagração da operação da PF. A investigação foi desmembrada em pelo menos
três focos: a atuação de Holanda, da AGU, a do ex-senador Gilberto Miranda, que
teria se beneficiado dos pareceres conseguidos com o esquema, e o das empresas
portuárias, que podem ter financiado a troca de favores. Os denunciados são
acusados de corrupção, formação de quadrilha e tráfico de influência.
Já
na área cível, a demora no julgamento da primeira ação de improbidade
administrativa contra os investigados ocorre por causa de sua transferência
para a Justiça Federal do Distrito Federal, feita a pedido da defesa de
Holanda, um dos nomes mais graduados da investigação. Fontes ligadas ao
processo afirmaram ao site de VEJA que a medida é procrastinatória, já que todo
o esquema foi operado no estado de São Paulo.
O clã Noronha
Personagem
principal do esquema, por sua proximidade com o ex-presidente Lula, Rosemary
Noronha não quis conversar com o site de VEJA — e tampouco seu advogado, o
criminalista Celso Vilardi. Ele faz parte da banca de onze advogados que cuida
da defesa de Rose, cuja fatura não se sabe ao certo quem paga. Além dos
processos cível e criminal, há outro imbróglio que requer a atuação da defesa.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu um pedido da
Infoglobo e do jornalista Thiago Herdy Lana para ter acesso aos gastos
efetuados com o cartão corporativo do governo federal utilizado por Rosemary,
com as discriminações de tipo, data, valor das transações e CNPJ/razão social.
A decisão saiu há 10 dias. Ainda cabe recurso.
Ao
site de VEJA, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, negou que o
Instituto tenha qualquer relação com a ex-funcionária. Okamotto afirmou que não
é amigo íntimo de Rose e se mostrou, de certa forma, insatisfeito com a forma
como ela tem sido tratada pela opinião pública. “Ela paga de forma
desproporcional pelos seus erros, se é que tenha cometido algum”, afirmou. Por
telefone, Rose disse que não “tinha nada para falar a VEJA, nem à imprensa”.
Antes adepta a viagens recebidas de presente de funcionários do segundo escalão
do governo, ela agora raramente sai de casa. Vive na mesma cobertura no bairro
da Bela Vista, região central de São Paulo. Recentemente, seus únicos
compromissos “inadiáveis” são as saídas para cuidar da estética.
Seu
marido, João Batista de Oliveira Vasconcelos, sustenta os gastos da família com
o negócio próprio: é dono de uma construtora no bairro do Jabaquara, em São
Paulo. Segundo a PF, a empresa está localizada numa saleta de um prédio frugal,
apesar de já ter tido contrato de 1 milhão de reais com a Cobra Tecnologia,
empresa que depois foi adquirida por um braço do Banco do Brasil.
José
Cláudio Noronha, ex-marido de Rose, também apontado como beneficiário do
esquema, tinha um cargo de confiança na Infraero de 2005 a 2014, onde exercia a
função de assessor especial. Em 15 de fevereiro deste ano, pediu a rescisão do
contrato.
Fonte:
Veja.com
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