O
candidato de concurso público que não assume a vaga por erro ou ato ilegal da
administração pública deve ser indenizado por danos materiais e morais,
independente do exercício do cargo. Esse foi o entendimento unânime da Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de relatoria do ministro Luiz Fux.
O processo interposto pela União e originário do Rio Grande do Sul recorria de
decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região que beneficiou um grupo
de aprovados.
Em
1989, um grupo de candidatos foi aprovado para os cargos de técnico judiciário
e oficial de justiça avaliador do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Entretanto
eles não tomaram posse, pois o edital do concurso determinava que os aprovados
deveriam ter formação em Direito, Economia, Administração e Ciências Contábeis
ou Atuariais. Os aprovados tinham formação em nível superior, mas em outras
áreas. Posteriormente essa exigência foi considerada ilegal em sentença
transitada em julgado (decisão judicial final que não comporta mais recursos)
em junho de 2002.
Em
fevereiro de 2003, os aprovados tomaram posse. Em 2004, eles pediram
indenização material pelos salários não recebidos da aprovação até a posse
efetiva e danos morais por não poderem exercer os cargos a que fariam jus por
quase uma década. A União alegou já estar prescrita a possibilidade de pedido
de indenização. A alegação foi aceita pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Porto
Alegre com base no artigo 269, inciso IV, do Código de Processo Civil. A 2ª
Vara entendeu que o dano ao direito ocorreu entre 1989 e 1991, quando este foi
efetivamente violado. Os interessados recorreram e o TRF4 aceitou o recurso.
A
União interpôs recurso no STJ com a alegação de que a decisão do TRF4 não teria
sido clara e não respondeu a todos os argumentos do recurso (artigo 535 do
Código de Processo Civil) e que já estaria prescrito o direito à indenização.
Além disso, afirmou que não haveria direito de receber os vencimentos
retroativamente, dependo do efetivo exercício do cargo (artigo 40 da Lei n.
8.112, de 1990).
No
seu voto, o ministro Luiz Fux considerou que o prazo de prescrição começa a
correr da ciência inequívoca do fato, no caso o trânsito em julgado da
sentença. Apontou que, antes disso, não haveria certeza do dano causado pela
administração pública. O ministro também considerou que, mesmo se manifestando
sucintamente, o TRF4 teria respondido adequadamente às questões levantadas pela
União. Ele destacou que a jurisprudência do STJ é pacífica ao afirmar que o
juiz não precisa rebater cada argumento da parte.
Segundo
o magistrado, não há impedimento para a indenização ser equivalente aos
pagamentos que deveriam ter sido recebidos, destacando que a jurisprudência do
Tribunal entende nesse sentido. O princípio da moralidade administrativa
consiste na "atividade dos administradores, além de traduzir a vontade de
obter o máximo de eficiência administrativa, terá ainda de corresponder à
vontade constante de viver honestamente, de não prejudicar outrem e de dar a
cada um o que lhe pertence", sendo "obrigação do Poder Público
indenizar o dano que causou", completou o ministro Fux.
NOTAS DA REDAÇÃO
No
ano de 1989 alguns candidatos aprovados no concurso público para provimento de
cargos de técnico judiciário e oficial de justiça avaliador do Tribunal
Regional do Trabalho da 4ª Região ajuizaram ação com o fim de declarar a
nulidade da disposição editalícia, que exigia para o preenchimento das vagas a
diplomação em Direito, Economia, Administração (Pública ou de Empresas) e
Ciências Contábeis ou Atuariais. Porém, os ora candidatos possuíam diplomação
em cursos diversos.
Os
autores lograram êxito de procedência e a União foi condenada a dar posse aos
candidatos, obedecida a ordem de classificação e mediante a apresentação do
diploma de Curso Superior oficialmente reconhecido.
A
retro sentença transitou em julgado em 19 de junho de 2002 e os autores foram
empossados nos cargos em fevereiro de 2003. Na sequência os autores ajuizaram
Ação de Indenização em desfavor da União, por danos materiais e morais. Para o
dano material sustentaram que durante o tempo que esperaram pela decisão
definitiva de mérito e até seu trânsito em julgado tiveram negada a posse e consequentemente
o exercício dos cargos para os quais foram regularmente aprovados, razão pela
qual perceberam vencimentos inferiores àqueles que lhe deveriam ter sido pagos.
Com relação ao dano moral alegaram que embora tivessem o direito de exercer os
cargos de nível superior, por mais de dez anos exerceram cargos de nível médio
"de status salarial e funcional inferior, com óbvios danos às suas
condições de existência, pessoais, profissionais, familiares e sociais".
Em
sede de primeira instância a Ação de Indenização foi extinta com julgamento do
mérito, nos termos do art. 269, inc. IV, do Código de Processo Civil, a seguir:
Art.
269. Haverá resolução de mérito: (Redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005).
(...)
IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) (grifos
nossos)
O
fundamento do juiz de primeiro grau foi no sentido de que o direito dos autores
foi violado quando deixaram de ser nomeados entre os anos de 1989 e 1991, ou
seja, o março inicial da prescrição. Tendo em vista que, nos termos do art. 1º,
do Decreto nº. 20.910/32 as dívidas passivas da União, seja qual for a sua
natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se
originaram, a Ação Indenizatória em tela, ajuizada em 2004, já está prescrita.
Resignados,
os autores apelaram, impugnando a sentença por entenderem que o prazo
prescricional passou a fluir a partir do trânsito em julgado da ação que
reconheceu o direito à posse. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por
maioria, deu provimento à apelação, pois entendeu que "prazo prescricional
relativo à pretensão indenizatória começa a fluir a partir do trânsito em
julgado da decisão que reconheceu o direito à nomeação, uma vez que antes disso
a pretensão dos recorrentes não havia nascido, porque tal direito ainda não
lhes fora reconhecido (...). Aos autores são devidos todos os valores pagos na
carreira no período em que foram preteridos, inclusive os referentes a
gratificações concedidas, feita a compensação dos valores recebidos no serviço
público de modo a evitar-se o enriquecimento sem causa".
Apesar
de a União rebater o acórdão do TRF da 4ª Região por meio dos embargos de
declaração os mesmo foram julgados improcedentes. E como derradeira tentativa a
União interpôs Recurso Especial sob o argumento de que "o acórdão
hostilizado contrariou o disposto nos arts. 535, do Código de Processo Civil,
art. 1º, do Decreto nº. 20.910/32 e art. 40, caput , da Lei nº 8.112/90, ao
fundamento de que: a) nulidade no acórdão recorrido, porquanto não supriu a
omissão apontada; b) a prescrição restou configurada, conforme assentado nos
moldes da sentença a quo; c) o pagamento dos vencimentos têm como fato gerador
o desempenho de cargo público, o vínculo só começa a partir do exercício do
cargo, inexistindo o direito à percepção retroativa de vencimentos, ainda que
sob a forma indenizatória".
Contudo
o Tribunal Superior negou provimento por entender que "O termo a quo do
prazo prescricional para o ajuizamento de Ação de Indenização contra ato do
Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca dos efeitos
decorrentes do ato lesivo. A prescrição da ação indenizatório, in casu, teve
como lastro inicial o trânsito em julgado da decisão que reconheceu
inequivocamente a violação aos direitos dos autores (...). O pleito
indenizatório é devido, porquanto comprovada a responsabilidade civil do Estado
que negou a posse aos recorridos, posteriormente concedida pelo Poder Público
(...). O pagamento da indenização a título de danos materiais, in casu, não
pode restar atrelado ao efetivo exercício do cargo, porquanto foi a própria
Administração que, ilegalmente, negou o direito a posse aos candidatos no
certame no qual lograram aprovação (...). O Tribunal de origem, embora
sucintamente, pronunciando-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta
nos autos, não viola o art. 535, do Código de Processo Civil (...) o magistrado
não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde
que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a
decisão".
Publicado
por Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (extraído pelo JusBrasil) -
DECISÃO
(fonte: www.stj.gov.br )
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