Mais
de 600 alunos do curso de formação da Polícia Federal, última etapa da seleção
para ser admitido na carreira, sofrem com a falta de professores na Academia
Nacional de Polícia (ANP). Eles estão sem aulas de abordagem, importante tópico
sobre como se comportar em operações, e terão de repor as aulas de armamento e
tiro, que ficaram suspensas por quase três semanas.
O
problema surgiu depois que pelo menos 14 instrutores foram afastados de suas
funções, no último dia 9. Uma queda de braço entre os profissionais e a direção
da instituição agrava a crise interna na PF, responsável pela segurança da Copa
do Mundo, que começa em 46 dias, e no momento em que a corporação investiga
casos de corrupção no alto escalão do poder.
O
estopim das divergências se deu na solenidade de comemoração dos 70 anos da PF,
em 28 de março. No teatro de arena que fica dentro da ANP, professores
descontentes com a instituição baixaram a cabeça e permaneceram em silêncio
durante a execução do hino da corporação.
A
manifestação silenciosa aconteceu logo depois de o diretor da PF, Leandro
Daiello, ressaltar os feitos da Polícia Federal e afirmar que a instituição
passa por um bom momento. Os profissionais quiseram demonstrar, além de
insatisfação salarial, descontentamento com a estrutura hierárquica do órgão e
com a falta de condições de trabalho como um todo.
O
fato causou mal-estar entre os superiores, sobretudo porque havia, na
cerimônia, algumas autoridades. Na semana seguinte, em 4 de abril, uma nova
manifestação colocou os professores e a direção da ANP em pé de guerra. Os
agentes decidiram se vestir com o uniforme preto da PF, usado em operações, no dia
do hasteamento da Bandeira.
A
direção da ANP anunciou a suspensão da solenidade e das aulas. A partir daí, os
624 alunos do curso de formação começaram a ser prejudicados em dois eixos
específicos: Serviço de Armamento e Tiro (SAT) e Setor de Ensino Operacional
(Seop).
Cinco
dias depois do protesto com o uso de roupas pretas, um ofício do diretor da
ANP, Sérgio Lúcio Fontes, determinou a remoção de 14 professores para outras
unidades da PF em Brasília sob o argumento de que "macular essas
solenidades com o pretexto de protestar contra o que quer que seja configura
grave violação dos deveres de professor". Além do grupo dos 14, mais cinco
docentes que estavam em Brasília, mas lotados em outras unidades da Federação,
voltaram para as unidades de origem.
Insatisfações
Os
profissionais se dizem perseguidos por manifestarem as insatisfações.
"Qual vai ser o padrão de tiro e abordagem?", questiona um professor
com mais de 10 anos na ANP. "Ele (o diretor) tirou pessoas do setor
operacional e não conseguiu substitutos porque é uma doutrina que foi montada
durante anos", diz outro agente. A dificuldade maior tem sido repor os
docentes de abordagem.
A
direção da academia teria até pedido apoio da Polícia Rodoviária Federal (PRF)
e da Polícia Militar do DF (PMDF) para que cedessem profissionais treinados na
área. No caso de armamento e tiro, já foram recrutados agentes da própria PF
para substituir os professores removidos.
Em
documento interno, remetido à direção pelo coordenador de ensino da ANP,
Leandro Almada da Costa, os funcionários que participaram das manifestações
foram classificados como "inconsequentes e irresponsáveis que desenvolvem
uma espécie de assédio moral vertical ascendente". O ofício informa que,
desde o episódio do aniversário de 70 anos da PF, os servidores envolvidos com
os protestos já estavam sendo identificados. "Independentemente da
legitimidade dos pleitos sindicais que originaram o ato, a mensagem que os
professores do SAT e Seop transmitiram de forma acintosa aos alunos do curso de
formação daquela data é que, na luta por interesses corporativos pessoais, vale
tudo, inclusive desrespeitar normativos, tradições, valores e símbolos da
PF", registrou o memorando.
Diante
das transferências forçadas, o Sindicato dos Policiais Federais no Distrito
Federal (Sindipol/DF) ingressou com mandado de segurança para que os
profissionais retornem aos postos anteriores. De acordo com a entidade, o juiz
que assumiu o caso deu um prazo para que a União preste esclarecimentos sobre o
assunto.
Questão salarial
Paralisações
e greves em todo o país têm colocado em xeque a capacidade da PF de garantir a
segurança em grandes eventos, como a Copa do Mundo. O maior impasse entre
agentes, escrivães e papiloscopistas — carreiras que aderiram aos movimentos
reivindicatórios — e a direção da instituição, está no reajuste salarial.
O
governo ofereceu pouco menos de 16% de atualização. Mas as lideranças da
corporação consideram que o índice nem sequer repõe a inflação do período. Além
disso, é crescente a tensão interna entre delegados e o restante dos
servidores. Na briga por investimentos, tendo em vista os grandes eventos
esportivos que o país sediará, a desorganização da PF levou o Palácio do
Planalto a privilegiar as Forças Armadas na alocação de verbas e aquisição de
equipamentos.
Fonte:
DefesaNet
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