Operações da Polícia Federal
apreenderam 3,7 toneladas de cocaína no maior porto do país. E os
desdobramentos ainda não terminaram
Uma
operação da Polícia Federal (PF) evidenciou nesta semana a fragilidade da
segurança no Porto de Santos (SP), o mais importante do país. Mesmo com a
instalação de scanners na alfândega nos últimos dois anos, traficantes de
drogas tentaram, sem sucesso, enviar do Brasil para a Europa, África e América
do Norte 3,7 toneladas de cocaína. Essa quantidade é equivalente ao total do
que foi apreendido pela PF entre março de 2013 e o último domingo.
Malas de cocaína ficam evidentes quando contêiner com sacas de café passa no scanner da Receita Federal
As
operações Hulk e Oversea da Polícia Federal identificaram dezenas de células
criminosas operando no litoral paulista. Elas se articularam com traficantes da
Bolívia e da Colômbia, responsáveis por fornecer a droga. Um dos pontos que
mais impressionaram os investigadores foi o contato direto, por telefone e
internet, entre fornecedores estrangeiros de cocaína e os pequenos traficantes
da Baixada Santista, ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) – a facção
criminosa que domina os presídios do Estado.
Mais
de 1,3 milhão de diálogos dos traficantes foram grampeados, com autorização da
Justiça, pelo Grupo de Análise da PF de Santos. E-mails também foram
interceptados. Apenas seis agentes coordenaram as escutas e produziram os
relatórios de inteligência da Oversea. As operações Hulk e Oversea,
classificadas por delegados como as maiores da PF no litoral paulista, foram
deflagradas na segunda-feira, em meio a movimentos de classe sindical de
agentes e escrivães da PF. Eles reclamam de falta de estrutura, sucateamento e
desvalorização salarial da carreira e ensaiam greves por todo o país.
Objeto de desejo, o fuzil de ouro do tráfico era negociado como presente, segundo investigadores
Apesar
das manifestações e de uma disputa interna de poder entre delegados e agentes,
os policiais apreenderam 3,2 toneladas em Santos (área da Oversea) e outra meia
tonelada na capital paulista e no interior do Estado (área da Hulk). As
operações tinham um alvo comum, o funcionário de um armador que trabalha há
mais de dez anos no porto direcionava as quadrilhas às embarcações que
navegariam até o destino da droga: Europa, África e América do Norte. As
operações são tratadas pela PF como as maiores já registradas. E os
desdobramentos ainda não terminaram.
Depois
de importar a droga da Bolívia e da Colômbia, os traficantes brasileiros
enviavam a cocaína dentro de malas e mochilas para armazéns específicos
conhecidos pela sigla REDEX (recinto especial para despacho de exportação). Há
47 deles registrados por empresas privadas no Porto de Santos.
Os
produtos exportados pelo Brasil ficam armazenados nesses locais em contêineres
antes de serem lacrados, pesados e transportados para os navios. Cabia ao armador
indicar em que REDEX a droga deveria ser inserida nos contêineres. Ele também
orientava em que tipo de carga as malas de cocaína deveriam ser escondidas para
evitar fiscalização: commodities como café e celulose, por exemplo. As malas eram
jogadas de forma grosseria e muitas vezes ficam visíveis no scanner, como
mostram imagens obtidas pelo site de VEJA.
Pagamento
Prestadores
de serviço cooptados pelas quadrilhas ficavam responsáveis por abastecer os
contêineres com a cocaína. Eles recebiam cerca de 1.500 dólares por quilo da
droga embarcada, de acordo com policiais federais ouvidos pelo site de VEJA.
Segundo a Polícia Federal, até o momento não houve identificação de servidores
públicos e donos de empresas ou navios envolvidos no esquema.
A
cocaína exportada era de alto padrão, com pureza acima de 92%. Os fornecedores
as identificavam com símbolos de empresas, como Toyota, Apple e até o personagem
de desenho animado Pica-Pau.
As
quadrilhas escolhiam o tipo da droga de acordo com a exigência do destinatário
final. As principais rotas eram para a Europa e passavam pelos portos da
Antuérpia (Bélgica), Valencia (Espanha) e Las Palmas (Ilhas Canárias). Um
carregamento que deveria chegar ao México foi apreendido em Cuba. A PF chegou a
monitorar um navio aportar na Itália com a cocaína oriunda de Santos, numa
“ação controlada”. Os traficantes europeus ainda estão sendo identificados
pelas polícias locais.
No
Brasil, a PF prendeu o traficante Suaélio
Martins Leda, que usava o nome falso Hélio
Alves Leda, e o advogado Carlos
Bodra Karpavicius. Leda foi alvo de outras operações similares da PF, como
a Capitão Jack, de 2009. Ele é réu na Justiça Federal por tráfico
internacional. Leda agia associado ao traficante Ricardo Blanco de Moura, de acordo com o Ministério Público
Federal.
Traficante que operava no Porto de Santos tinha sítio com piscina, deck e lago natural
Ele
importava droga do Paraguai e armazenava em Santos até conseguir despachar em
contêineres. Na Oversea, o traficante foi apontado pela PF como o dono de um
sítio “de dimensões cinematográficas” em Mogi das Cruzes (SP). O local fica
próximo ao KM 74.4 da Rodovia Mogi-Bertioga. As fotografias do sítio
registradas durante a Operação Oversea mostram dependências de alto padrão, com
lago natural, piscina, deck, jardim ornamentado e duas quadras, sendo uma de
tênis. O sítio estaria em nome de uma offshore uruguaia, segundo policiais. A
PF também apreendeu uma catamarã de cerca de 70 pés de comprimento,
supostamente em nome de Bodra.
Bahia
Outra
quadrilha desmantelada na Oversea era liderada pelo ex-policial militar da Tropa
de Choque Angelo Marcos Canuto da Silva,
o Fusca. Canuto é ex-presidiário e atuava como empresário de jogadores de
futebol e de boxeadores na Plus Sports. No site da agência de marketing
esportivo, ele aponta como “agenciados” jogadores de clubes da elite nacional
como Corinthians, Flamengo, Botafogo e Sport. Canuto também é sócio de uma
transportadora, a Stillos Express, com sede declarada em São Paulo.
A
célula operada em Santos e São Paulo por Canuto, João dos Santos Rosa e mais um comparsa enviou cocaína para a
Europa também pelo Porto de Salvador, na Bahia. A inteligência da PF
interceptou telefonemas em que os criminosos comentam a ação. Eles também
buscavam outra rota de exportação pelo Sul do país, depois que as apreensões se
intensificaram no fim do ano passado no litoral paulista.
PCC
A
quadrilha de Canuto transportava a droga dentro do painel e sob os bancos de
carros de luxo, como SUVs. Durante uma apreensão, a PF encontrou 50 quilos de
cocaína e uma conta de luz dentro de um automóvel. Ao chegar ao endereço do
imóvel na conta de energia, uma casa em Bertioga (SP), os federais localizaram
mais 400 quilos de cocaína.
A
célula criminosa de Canuto era ligada ao traficante boliviano Rolin Gonzalo Parada Gutierrez, o Federi.
Ele está foragido, assim como outros alvos da Oversea, a maioria, moradores dos
arredores do porto, que executavam funções para despachar a droga. Eles eram
aliciados por integrantes do PCC na Baixada Santista. Um deles é André Oliveira Macedo, o André do Rap,
de 37 anos, também foragido.
Os
investigadores também encontraram vínculos dos criminosos com o médico Frederico Chamone Barbosa da Silva, o
Dr. Fred Barbosa, que foi candidato a vereador em 2012 pelo PSC, mas não se
elegeu. Ele já estava preso desde o ano passado, acusado de tráfico de drogas e
envolvimento com o PCC pela Polícia Civil de Santos.
Procurados
André Oliveira Macedo
Carlos Miguel Pina de Castro e Silva
Diogo de Souza Marques, conhecido como Lost
Ednilson Rodrigues Caires, conhecido como Black
Gilcimar de Abreu, conhecido como Poocker
Gilmar Flores, também conhecido como Flores, Gil e Xira
Jefferson Moreira da Silva, também conhecido como Dente e Coelho
Luciano Hermenegildo Pereira, também conhecido como Rodrigo e Zé
Márcio Henrique Garcia Santos, também conhecido como Messi e Orelha
Rolin Gonzalo Parada Gutierrez, conhecido como Federi
Wagner Vicente de Liro, também conhecido como Driely e Bafinho
Fonte: Veja
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